Greyce Riquinho
Certo dia estava na casa da minha hostfamily nos Estados Unidos e pedimos pizza. Pizzas naquele país se resumem, praticamente, aos sabores de queijo e calabresa. Eu pedi pizza de frango e minha mãe americana, espantada, sem saber se a pizzaria fazia pizza de frango, ordenou meio sem graça ao telefone…
A pizza chegou e corri para a geladeira para pegar a mostarda e o ketchup. Quando comecei a colocar sobre a pizza, os olhos de espanto, incrédulos de que eu realmente comeria uma pizza recheada de frango, se arregalaram ainda mais, por estar colocando mais coisas nela. Lembro-me de ter ouvido algo do tipo: “Mas… como você vai colocar Ketchup aí, se a pizza já vem com molho de tomate… isso é muito estranho! Nunca vi algo desse tipo…”.
Essa foi uma cena que me marcou muito, porque fazia algo tão normal, tão parte do meu cotidiano culinário de sextas-feiras e que aos olhos de outra cultura foi visto com estranheza.
Houve ali uma troca de experiências, sem dúvida. Naquela noite, havia ensinado a minha família americana mais uma das mil e uma utilidades do ketchup (visto que o espantoso, neste caso, não deveria ser o fato de eu colocar ketchup na pizza, mas sim, o de americanos terem um rol tão diversificado de comidas que viram pretexto para o uso do ketchup!).
Isso me fez pensar muito na saudade que hoje sinto de estar fazendo uma troca de conhecimentos, até quando se está comendo! Qualquer coisa, a qualquer momento, pode fugir da trivialidade e te pegar de surpresa (ou fazer com que você surpreenda quem está a sua volta!).
Fazer amizade com pessoas diferentes te faz perceber que por mais que você tenha convicção sobre suas ideias, é sempre possível encarar as coisas sob uma outra perspectiva, porque no final das contas, quem incutiu na sua cabeça o que era certo ou errado foi o seu país, o seu ciclo de amigos, a sua família, sua rotina diária de estar sempre nos mesmos lugares, com as mesmas pessoas.
Se um intercâmbio de hábitos culturais já é possível entre duas pessoas de diferentes culturas, imagina entre uma variedade de culturas do mundo inteiro ocupando um mesmo espaço.
Moro em uma cidade no Brasil, que embora tenha suas tradições bem especificas, não possui algo que atraia turistas do mundo inteiro a ponto de você sair na rua e ouvir diferentes línguas, encontrar pessoas com traços ou vestes que te fazem pensar de onde possam ser, mas ter a certeza de que não são daqui… Não digo que nunca passe turista por aqui, mas o mais provável é você ter que ir para o aeroporto se quiser ouvir um pouco de um inglês original, por exemplo.
Sinto falta de estar em um país fora do meu, sabendo que fui para aquele lugar na intenção de absorver um pouco da cultura local e acabo descobrindo que um tanto de japoneses, chineses, hispanos, russos, italianos, alemães e uma infinidade de outras culturas, decidiram o mesmo.
Acaba que o país se transforma em um QG de culturas, independentemente da cidade onde você esteja. Ninguém chega sem acrescentar nada, todos trazem para a cultura que escolheram conhecer, um pouco da sua própria. É como uma terapia em grupo de troca de culturas! Você vê sob a perspectiva de outras origens o que é estar passando pelo mesmo que você.
No momento em que aprendemos a sair da toca, quebrar os muros que nos rodeiam, parar de procurar um pouco só os que se assemelham a nós, estaremos prontos para cultivar amizades verdadeiras. Percebemos que não tem nada a ver achar algo feio, bizarro, estranho e dar risada por estar tão em desconforme com nossos padrões.
Quando você começa a perceber que você não é obrigado a incorporar na sua vida uma coisa que você não se adaptaria jamais (comida, habito, etc), mas aceita… apenas isso: aceita, você passa a fazer amizades incríveis com pessoas do mundo inteiro.
Você pode estar longe de casa o tempo que for e o tempo todo, pessoas novas estarão chegando de todos os lugares do mundo e outras estarão indo embora também.
Quando cai a ficha de que ninguém realmente pertence aquele lugar, que o tempo de cada um ali naquele país é passageiro e geralmente com um propósito bem definido, vem um sentimentozinho de medo de nunca mais encontrar aquela pessoa que está voltando para sua casa. É que quando se está longe de casa, amigos tornam-se uma extensão de nossa família mais do que em condições normais de convivência.
Lembre-se, no entanto, que o legal de tudo isso é que conexões feitas, serão sempre conexões. Eu voltei para o meu país e todos os amigos do mundo inteiro que fiz, também já voltaram para os seus (salvo, duas ou três amigas que encontraram nos Estados Unidos o amor de suas vidas e por lá ficaram até hoje).
E por mais que o sentimento da despedida da convivência com alguém naquele país, naquele momento único que é o intercâmbio, onde está todo mundo na mesma vibe, seja temporariamente desolador, sempre virão outros momentos e outras viagens onde será possível um reencontro. Por que não?!
Eu fui fazer um mochilão pela Europa anos atrás e consegui reencontrar algumas pessoas que contribuíram para a eternização dos meus momentos de intercâmbio, pessoas que serei eternamente grata por terem cruzado o meu caminho e ampliado muito mais meus conhecimentos em termos de, não digo só de cultura, mas de mundo! Também foi no intuito de reencontrar estes que eu denomino de “amigos do mundo”, que eu conheci muitos lugares no meu próprio país!
E que venham muitas viagens, muitos amigos e muitas trocas de conhecimento para todos nós!